sexta-feira, agosto 16, 2019
À mesa da Assembleia-Geral da A.A.M.C., na pessoa do seu
Vice-Presidente, Professor Francisco Gil Sousa Vieira Mendes:
Venho
comunicar-lhe a renúncia ao cargo de Presidente da Assembleia-Geral.
Agradeço-lhe o testemunho de solidariedade que me dispensou, bem como ao
vice-presidente da direcção, Eng. Rui Cunha, e presidente do conselho Fiscal,
Alberto Araújo.
As razões, que
aduzo, são as seguintes:
1.- Está
desvirtuado o sentido que foi dado à AAMC e já não me identifico com o rumo que
esta direcção lhe deu.
A AAMC é uma associação de amigos
e eu não aceito que me considerem um conspirador, que pretende fazer um golpe
para se manter nos órgãos sociais da Associação.
Foi por razões de princípios que
criamos a A.A.M.C. Nenhum de nós, que a fundamos há cerca de 20 anos, pensou na
sua “vidinha”, mas na defesa do exercício da cidadania, contra as
arbitrariedades, a prepotência e o trauliteirismo com que eram tratados os que
discordavam com o, então, responsável pela autarquia.
Fundamos a Associação à nossa
custa (e não foi pouco!), sem subsídios e mantivemos o seu funcionamento com o
nosso esforço financeiro e o apoio de alguns democratas que se solidarizaram
com a nossa causa. Alguns de nós sofreram “vendetas”: o prof. Gil Mendes foi
insultado e no próprio gabinete do Presidente da Autarquia cobardemente
agredido, eu próprio, durante quase um ano, recebi telefonemas anónimos e uns
“jagunços” estiveram à minha porta para me intimidarem à custa de uma tareia, o
Alcino Queirós foi perseguido no seu comércio de flores, o Alberto Araújo
ameaçado junto à Câmara, etc.
Desde a sua criação, a nossa
Associação funcionou como uma Organização Não-Governativa da Cidadania,
denunciando aquilo que os partidos
não faziam por razões que se prendiam com a cadeia de interesses pessoais e
políticos (uma junta de freguesia desalinhada com o presidente ficava
ostracizada). É do espírito da Associação o distanciamento do poder político
para melhor defender as virtudes da democracia, sempre ameaçadas pela tendência
de controlismo, arbitrariedade e favorecimento político de conveniência. Contrariar
esta tendência é razão de ser da AAMC e não o de se transformar numa “agência
do poder local”.
2. O prestígio que a Associação ganhou deveu-se a essa
postura e foi ela que permitiu que personalidades, de diferentes quadrantes,
acedessem aos nossos convites para debates de variadíssimos temas. Entre
outros, realizamos acções com o saudoso Miguel Portas, a filha de Humberto
Delgado, o saudoso Raul Brito, Capitães de Abril, como os saudosos Tomás
Ferreira e Brandão, Rui Rio, Honório Novo e muitos outros. Até o Presidente do
Tribunal Constitucional veio ao Marco, convidado pela Associação, falar sobre
Direitos Humanos. Inclusivamente, a AAMC foi recebida pelo Provedor de Justiça
e participou (com uma comunicação), em Coimbra, num Congresso sobre a
Cidadania, onde estava um representante do Presidente Jorge Sampaio.
A
cobertura que foi dada à acção da AAMC em toda a imprensa foi a prova evidente
do prestígio da sua postura.
3. Na fase em que era presidente da AG o nosso saudoso amigo,
Dr. Horácio Salgado, em todas as acções públicas, o presidente da Direcção e o
presidente da Assembleia estiveram juntos na mesa da presidência dos debates. Para
nós, isso justificava-se por duas razões:
a)-dignificar o órgão que representa os sócios e o órgão responsável
pela gerência das actividades.
b)- evitar que alguém acusasse o presidente da direcção de
procurar protagonismos para obter dividendos políticos.
Estes
propósitos, por mim muitas vezes referidos ao presidente da direcção actual,
foram no seu mandato rapidamente abandonados. Até no dia de um debate sobre
futebol, em que participou o meu genro, isso aconteceu.
4.- Os mandatos dos cargos faziam-se como se faz em todas as
associações: no princípio do ano havia uma assembleia-geral para aprovar o
plano de actividades e o orçamento; no fim do ano, aprovava-se o relatório de
contas. De três em três anos, marcava-se uma Assembleia para aprovação do
relatório de contas e outra (a Assembleia Eleitoral) para eleger os corpos
sociais. Nunca foi preciso invocar os estatutos, porque para todos nós era uma
questão de bom-senso que assim acontecesse. Eu próprio passei por corpos sociais,
como os do Ateneu Comercial do Porto, da Associação de Jornalistas e Homens de
Letras do Porto, do Instituto do Terço, (onde fui presidente da assembleia), da
Associação 25 de Abril e de outras, onde sempre assim se procedeu. Este ano,
como presidente da Assembleia Geral do Clube de Caçadores de Soalhães assim
também foi feito.
5.- Depois de um longo período de adormecimento da AAMC,
pretendi, há três anos, reactivá-la. Telefonei a alguns sócios e promovi novos
associados. Por indicação de um saudoso amigo, indiquei para presidente António
Ferreira (diga-se de passagem que, posteriormente comecei a perceber que foi um
erro de casting, como me iam avisando).
Fez-se
uma lista para os diferentes órgãos e a votação foi feita de braço no ar e nem
o actual presidente se lembrou das cláusulas dos Estatutos que tanto
insistentemente reivindica para as próximas eleições. Aliás, não sei se estes
estatutos (por tão confusos serem) foram os aprovados ou é a proposta que um
dos fundadores entregou e ficou no meu computador.
6.- Reactivada a AAMC, alguns eleitos nunca mais apareceram e
nunca nenhum órgão passou a funcionar com todos os seus membros. É muito
possível que nem sempre as decisões, que neste mandato foram tomadas, tenham
tido quórum. Achei que esta situação deveria ser corrigida no fim do mandato.
7.- Como durante este ano termina o mandato, marquei, então, uma
reunião para finais de Julho. O secretário da Direcção, Peres, foi de opinião
que a reunião deveria ser em Setembro. Fiz ver que, nessa altura, poderia muita
gente estar em férias, mas acabei por adiá-la para essa data. O sr. Presidente
da Direcção ter-me-á enviado um email que, por razões que desconheço, não
recebi. Ao procurar o Peres, para um assunto diferente, perguntou-me se tinha
recebido o email. Espantado, disse-lhe que não. Foi, nessa altura, sugerida uma
reunião para o dia 21 de Julho, pois no dia anterior tinha uma AG do Clube de Caçadores
de Soalhães, a que eu presidia. Foi sugerido as 18h, mas como o Peres me disse
que, a essa hora, havia uma procissão, sugeri-lhe as 15h.
8.- Dias depois, recebo um email da direcção a desconvocá-la.
Fiz ver que a desconvocação de uma AG é da competência do Presidente da
Assembleia Geral. Justificaram com o facto de não me encontrarem pelo telefone,
mas a Assembleia Geral podia ser por mim, presidente da A.G., desconvocada no
próprio dia, por falta de condições. É interessante notar que, segundo o
presidente da Direcção, o email para desconvocar os sócios de uma AG só serve
para António Ferreira. Sendo usado por mim, já não serve para convocar outra,
como se vê a seguir.
9. – Numa carta, o sr. Presidente
da Direcção faz uma invocação à letra dos estatutos, sem ter em conta as suas
contradições e o que faz costume (o costume também tem força de lei, chama-se
direito consuetudinário), para, em síntese, dizer o seguinte:
No
artº 7, o ponto 4º refere:
“A
Assembleia Geral reúne obrigatoriamente em sessão ordinária durante o
primeiro trimestre de cada ano, por convocatória do Presidente da Mesa
enviada com antecedência de trinta dias
no mínimo, por meio de aviso postal
expedido para cada um dos associados. Esta reunião servirá para apreciar e
votar a proposta de Orçamento, o Relatório, Balanço e Contas da Direcção e o
Parecer do Conselho Fiscal, bem como para eleger os novos corpos
Gerentes quando terminados os mandatos e deliberar sobre os assuntos da
ordem do dia.”
No
artº 9 diz-se: à direcção compete:
(…)
“elaborar no fim de cada ano de gerência o relatório, balanço e contas
referentes ao mesmo ano que serão submetidas à apreciação da Assembleia-Geral
com o correspondente parecer do Conselho fiscal”.
10.- Como se percebe, há aqui, nos estatutos, uma contradição
e confusão, pois, no final do mandato não há proposta de orçamento,
porque esta é feita pela nova Direcção. Não se pode
misturar na mesma reunião, a proposta de orçamento, o balanço e contas da
direcção com a eleição. A Assembleia eleitoral é distinta. E o “bem
como” não pode ser entendido como “logo a seguir” (imediatamente), na mesma
ordem de trabalhos.
11.- Dei disto conhecimento a alguns advogados que
concordaram comigo, mas, mesmo assim, adiaria, como sabe o prof. Gil, a reunião
para o próximo ano.
12.- Sou, entretanto, informado, que uma delegação de dois “mandarins”,
membros dos corpos sociais, um que paga cotas e outro que o primeiro diz que nunca
as pagou, me enviava, indirectamente, a seguinte mensagem acusatória e
chantagista: eu, presidente da Assembleia Geral, pretendia um “golpe para me
manter no cargo” e que era intenção do sr. Presidente da Direcção, António Ferreira,
recorrer à justiça para impor o adiamento da A.G. para o próximo ano. E,
com esta posição estaria não só os mensageiros, mas também o vice-presidente
eng. Rui Cunha, o que, pelo próprio soube, não ser verdade!
Os
advogados, a quem falei nesta ameaça, gozaram e disponibilizaram-se para me
defender neste grave “crime”, mas a mim, o despropósito da ameaça e chantagem
(que só serve uma estratégia de ganhar tempo e possibilitar encharcar de sócios
de conveniência a Associação e obter a”vitória final”, o que, evidentemente,
para os “mandarins” não constituirá um golpe) feriu-me muito. Não faço guerras
pessoais, por interesses pessoais e, para além da AAMC, tenho, à minha
disponibilidade, outros meios para exercer o direito à cidadania.
13. - A Associação dos Amigos do Concelho do Marco é uma
associação de amigos (poucos, é verdade!) que nunca visou olhar pela “vidinha”
dos seus elementos, mas promover o exercício da cidadania. Não é uma associação
com um Presidente da Assembleia-Geral golpista.
14.- Esta questão “golpista” arreliou-me! Não esperava esta
acusação e fez-me concluir que já nada tinha a ver com a AAMC. Peço, por isso, a renúncia do cargo de presidente da
AAMC, mas não só: peço também
que seja abatido como sócio (número um), para não perturbar qualquer ingerência
golpista.
Peço, ainda, ao Sr. Vice-Presidente
da Assembleia-Geral que transmita aos corpos sociais esta decisão e que a sede
da AAMC fique com tudo o que para lá levei (livros, exposição, quadros, etc.),
para que a memória da minha passagem pela Associação continue com algum
significado.
Com cordiais saudações,
03 de Agosto de 2019
João Batpista Vasconcelos Miranda Magalhães
(ex-presidente da AG da AAMC)
terça-feira, março 19, 2019
A questão dos Templários
O
que terá levado Brenton Tarrant, o suspeito terrorista da Nova Zelândia, a
visitar a Ordem dos Templários? Não se sabe, mas conhecem-se histórias
interessantes que estiveram na origem dessa Ordem em Portugal.
Durante
o Papado de Avinhão, conhecido por Grande Cisma do Ocidente (1309-1417) vieram
ao de cima as grandes contradições que existiam no interior da Igreja e a
promiscuidade entre poder temporal e espiritual, com interferências recíprocas.
Tudo começou com Filipe IV, de França (1268-1314), cognominado o Belo. Devido
ao desmesurado esbanjamento com a vida de luxúria e espavento da corte, os
cofres do seu reino foram ficando vazios e a coroa, cheia de dívidas, tinha,
como maior credor, a Ordem dos Templários que regressara á Europa depois da
perda dos últimos bastiões na Terra Santa.
Esta
Ordem tinha sido fundada em 1096 com o propósito de proteger os cristãos que se
dirigiam para Jerusalém após a sua conquista. Os seus membros faziam voto de
pobreza, entregavam todos os seus bens à Ordem e, durante o tempo em que as
cruzadas empolgaram a Europa, foram-lhes doadas milhares de propriedades. Desenvolveram
uma intensa actividade económica, criando, nos locais por onde seguiam os
peregrinos, uma rede de postos bancários onde, com uma carta de crédito, se
poderia levantar em moeda o equivalente depositado na Ordem.
Era conhecida a fortuna colossal que os
templários detinham. Sabendo disso, Filipe IV, para fazer face às dificuldades
financeiras do seu reino, recorreu aos templários para obter um empréstimo
fabuloso que lhe permitisse resolver os problemas financeiros do reino. Mas,
mesmo assim, não conseguiu saldar as dívidas. Decidiu-se, então, pelo confisco
dos bens dos judeus e banqueiros e lançou um imposto sobre o clero e mosteiros.
O Papa Bonifácio VIII, alertado para esta situação, emitiu a bula Clericis Laicos, onde declarava a
superioridade do poder espiritual sobre o temporal, proibindo aos príncipes seculares
aplicar ao clero qualquer imposto, o que retirou legitimidade ao Rei de França
para os impostos que lançara. Irritado, Filipe IV tentou por intrigas e
acusações várias demover o Papa. Não o conseguindo, enviou uma força armada a
Roma para o depor. A violência com que foi tratado, acabou por levá-lo à morte.
Depois de um período conturbado, o Rei de França conseguiu que fosse eleito o
cardeal francês Clemente V, que, submisso ao Rei, transferiu a sede do papado
para Avignon, com toda a sua estrutura
institucional, nomeadamente o Tribunal da Inquisição, ficando para a
ortodoxia romana conhecido como antipapa.
Como a dívida aos Templários era enorme,
Filipe IV fez deles inimigos da ortodoxia cristã, visando extinguir a Ordem
para extinguir a dívida. Aproveitou a capacidade de influenciar o Papa para
acusar os Templários de pregar heresias, praticar a sodomia e de levarem uma
vida devassa.
Fazendo insistentemente estas acusações,
conseguiu que Clemente V, o papa de Avinhão (que lhe era submisso) colocasse os
inquisidores que agradavam ao Rei a averiguar o caso no Tribunal do Santo
Ofício.
A Ordem foi sujeita a torturas para
confirmar as acusações de Filipe IV de França. Nada adiantou aos 573 cavaleiros
que, em defesa da verdade, afirmaram que as confissões tinham sido arrancadas
pela tortura e as acusações eram difamantes.
Filipe IV não descansou e conseguiu que
o (seu) papa, pela bula Vox Clamantis, em 1312, extinguisse a Ordem e sentenciasse os seus principais
cavaleiros à prisão perpétua. Ao ouvirem a sentença, o grão-mestre Jacques
Molay e outros, em pleno Tribunal, levantaram a voz para bradarem sua inocência
e denunciarem o labéu. Devido a esse acto, considerado de insubmissão, nesse
mesmo dia, armou-se uma fogueira e foram queimados vivos.
Extinta a Ordem, o Rei ficou sem o seu
credor e, por isso, achou prescrita a dívida e os bens, que os Templários
dispunham, foram distribuídos pela coroa e pelo papado.
Nessa altura, o rei de Portugal, D.
Diniz, não só disponibilizou o Reino para receber os perseguidos, que chegavam
de França e de outros países, como transferiu todo o património, que os
Templários ainda conseguiram juntar, para uma nova Ordem, a Ordem de Cristo,
que lhes foi entregue. E disponibilizou-lhes o castelo de Tomar para se
organizarem em Portugal. Com os Templários difundiu-se em Portugal os
conhecimentos adquirido no transporte de peregrinos entre a Europa e o Oriente
Médio, bem como tecnologia náutica,
mapas e livros de viagens que, mais tarde, o Infante D. Henrique soube
aproveitar para o desenvolvimento da expansão marítima.
Fracassada a tentativa de reconciliação
com um concílio em Pisa, em 1409, o Cisma passou a ter três papas rivais à
cabeça da cristandade: o de Roma, Gregório XII, apoiado pela Itália,
Inglaterra, Polónia, Hungria e Portugal; o de Avignon, Bento XIII, apoiado pela
França, Castela, Aragão, reino da Sicília e de Chipre; o de Pisa, o Arcebispo
de Milão, o grego Petros Filargis, apoiado pela Grécia e por uma parte de
Itália, que escolhe o sobrenome de Alexandre V.
Oito anos depois, em 1417, com o apoio
de Sigismundo Imperador Romano-Germânico, foi convocado o Concílio de
Constança. Foi acalmada, então, a vontade secular dos monarcas e tornou-se
consensual a necessidade dos três papas abdicarem para ser escolhido um
terceiro que, definitivamente, ficaria em Roma. E foi eleito Otto de Colonna
como Papa Martinho V, colocando-se uma pedra no Grande Cisma Papal do
Ocidente.
E Tomar continuou com os Templários,
antigos cavaleiros da Guerra Santa contra os infiéis!
segunda-feira, dezembro 10, 2018
Neste dia comemoram-se os DIREITOS HUMANOS
Os direitos humanos estão associados ao exercício da cidadania na defesa da democracia e de uma solidariedade antropocósmica, em que o homem (e não o capital) seja o centro do cosmos.
Nem sempre o legal coincide com o justo e se obedecer à lei é um imperativo cívico, ser justo é um imperativo ético: correspondem a um dever incondicional.
Como reacção, a uma globalização do mercado vai-se opondo uma globalização da cidadania exercida através das Organizações Não Governamentais (ONGs) que lutam pelos direitos humanos: culturais, ecológicos, defesa das minorias, etc. Também nesta fase, surgem os movimentos feministas, pacifistas, anti-racistas, anti-nuclear, etc., o direito à intimidade e à privacidade, à objecção de consciência e à diferença nos comportamentos sexuais.
Vivemos hoje num mundo cheio de paradoxos: por um lado, tudo parece possível à inteligência, desde compreender os mecanismos da vida até desbravar o espaço; por outro, em alguns países, muitos homens sofrem a tortura, a fome, a perseguição por motivos religiosos, políticos e de raça e são condenados à morte, a fugirem dos seus países e a viverem em situações infra-humanas. Mas há ainda outros problemas, mulheres, crianças e velhos são desrespeitados na sua dignidade e nos seus direitos. Comemorar a criação dos direitos humanos é alargar a consciência de que não há outra forma se ser humano a não ser a de respeitar a dignidade, os direitos de cada um dos nossos semelhantes.
Obviamente, os Direitos Humanos não podem ser olhados como um conjunto de deveres independentes da vida que vivemos no da-a-dia.
Se quiséssemos um inventário genérico dos direitos humanos, poderíamos dizer que estes consubstanciam os seguintes direitos:
à vida,
à integridade pessoal (a não sofrer mutilação física ou psíquica)
a não ser maltratado, nem torturado;
a não ser condenado sem processo prévio
à intimidade da vida privada;
a exercer a cidadania
ao segredo da correspondência;
à inviolabilidade do domicílio;
ao bom nome e à fama;
à escolha de estado: solteiro, casado, etc.;
à livre expressão do pensamento;
à informação;
a escolher residência e a deslocar-se de um lugar para o outro;
à educação; ao descanso; a associar-se para conseguir fins lícitos: económicos, culturais, religiosos, etc.
a utilizar o próprio idioma e viver segundo a própria cultura;
à qualidade de vida;
à preservação das espécies
etc.
Estes direitos não surgiram todos ao mesmo tempo e, por isso, podemos falar de várias gerações dos direitos humanos.
A primeira geração dos direitos humanos surgiu como reacção à desigualdade política e cívica. Esta fase corresponde ao projecto de emancipação do homem da modernidade. O liberalismo do séc. XVIII até ao século XIX cobriu o período de expansão e consolidação dos direitos civis e políticos -- direito à propriedade, a uma nacionalidade, à liberdade de reunião, a eleger e ser eleito, a circular livremente, ao bom-nome, etc.
A segunda geração ganha força com a reacção às desigualdades sócio-económicas e à exploração do homem pelo homem. Corresponde à ideia de Estado Social de Direito. É o período da conquista dos direitos sociais e económicos, direito ao trabalho, ao lazer, à organização sindical, à segurança social, à instrução, etc.
A terceira geração aparece como reacção à desigualdade cultural, à massificação social e à globalização. Corresponde à crise do modelo de crescimento económico apoiado na ideia de industrialização intensiva e à crise do Estado-Providência. Procuram também dar resposta à globalização, entendida como o “mercado da aldeia global”.
Os próprios problemas suscitados pelos progressos científicos e tecnológicos no domínio da biologia, da medicina, da saúde e da informação colocam, nos nossos dias, problemas de natureza ética e social. Fala-se já na Quarta Geração dos Direitos Humanos que compreende a protecção de dados pessoais face à informática, a defesa da dignidade da pessoa humana nos transplantes, nos progressos da engenharia genética e sua aplicação, nomeadamente nas experiências com embriões para obter indivíduos com idêntico património genético (clonagem).
terça-feira, setembro 11, 2018
segunda-feira, setembro 03, 2018
Seguir os bons exemplos como forma de os dignificar!
Estou de acordo com D.
António Marto, que admiro e de quem sou amigo. Mas o ataque ao Papa Francisco
não é só feito pela carta ignóbil de um ex-núncio ou por outras difamações, mas
também por práticas que nas dioceses contradizem a postura do Papa, com a falta
de diálogo e até de avaliação humana do trabalho de alguns sacerdotes. Estou-me
a lembrar da forma como foram corridos alguns padres na diocese do Porto das
direções de colégios, nomeadamente o Padre Clemente do Colégio de Amarante. A
Igreja do Papa Francisco deveria seguir o seu exemplo e ser una no modo de ver
a vida, os homens e o papel da formação intelectual e humana dos seus colégios.
É, de fato, perturbante que se possa pensar que um colégio diocesano tem de dar
lucro e que uma administração que não os apresente seja demitida de forma pior
do que há quem demita uma funcionária de limpeza. O padre Clemente parece estar
com residência fixa, não podendo passear no colégio nem falar com professores
ou alunos! E estranho que, sendo Amarante, uma terra de gente solidária e de
ideias liberais, ainda não tenha levado a cabo uma manifestação de
solidariedade para com o diretor do seu Colégio, sabendo-se que foi sempre
muito admirado e estimado entre os amarantinos! Sabe-se que ele não quer, mas
isso não tira que se faça um almoço da sua despedida do Colégio - e isso já era
um sinal de apoio, numa altura que se sabe que o padre Clemente tem sofrido com
esta situação!
sexta-feira, agosto 10, 2018
Dia do Concelho do Marco de Canaveses-Dia de Nossa Senhora do Castelinho
Poucos concelhos terão na sua origem
uma história tão próxima da natureza humana, tão configuradora da ideia de
segurança, de transcendência e bem-estar, como o Marco de Canaveses.
No dia 3 de janeiro de 1852 faleceu o sargento-mor
das milícias do julgado de Bem-Viver, José Joaquim de Abreu e Lemos, fidalgo do
solar de Carrapatelo. Era dia de feira no lugar do “Marco”, assim chamado pela pedra (marco) que aí
limitava dois coutos que vieram a dar origem às freguesias de Fornos, S.
Nicolau e Tuias. Por se situar numa planura e no limite das comarcas de
Canaveses, Tuias e Soalhães era nesse espaço que se realizavam famosas feiras
nos dias 3 e 15 de cada mês. Também foi nesse local que se levantou a Casa
Municipal do Concelho de Soalhães e mais tarde, depois da fundação do Concelho
do Marco o edifício da sua Câmara Municipal.
Nas contendas políticas da altura ganhou a fação contrária a esta ideia. O busto de Adriano José de Carvalho e Mello foi, em festa, colocado no Jardim Municipal e a inauguração da obra do Dr. Cabral de Matos foi sendo adiada, acabando por ficar esquecida até ao nosso tempo, talvez para não lembrar o seu obreiro. Mas o Jardim, mesmo sem ser inaugurado, foi incorporando diferentes inaugurações, afirmando-se como uma das melhores referências do Concelho.
A morte do Fidalgo de
Carrapatelo foi notícia na Feira que se realizava nesse dia. Um tal Vinagre,
que fazia comércio de azeite e de outros géneros, estava com alguns problemas
financeiros e sonhou logo com o “golpe”. Levou a nova ao José e ao António,
morgadinhos de Canaveses (filhos de um fidalgo falido) que já haviam colaborado
com o Zé do Telhado. Os três avaliaram as vantagens do assalto à casa do
Fidalgo e os morgadinhos levaram a sugestão ao Zé do Telhado. Ficou combinado
contratar gente de confiança que, no dia 7, se encontraria, à meia-noite, numa
corte situada junto à capela de S. Braz, em Fandinhães, Paços de Gaiolo, para
planear o assalto que se realizaria no dia seguinte. (foto da capela)
Acertadas as
incumbências de cada um, no dia 8, ao princípio da noite, a quadrilha, que
comportava cerca de 30 homens, capitaneada por Zé do Telhado, partiu para o
roubo. Por volta das nove horas forçaram a porta da cozinha e penetraram no
Solar. O Zé do Telhado obrigou D. Ana Vitória, filha do Fidalgo, a entregar-lhe
todos os valores que seu pai lhe tinha deixado. Entretanto outros elementos da
quadrilha iam roubando as peças
de ouro e prata que as senhoras que, nessa
altura, estavam no Solar traziam. O pior, foi terem morto a tiro o criado João
Carvalho que se opôs à entrada da quadrilha. Tudo isto criou uma tremenda
insegurança e manchou a dignidade do povo desta terra. O Sr. Adriano da
Picota, como era conhecido o deputado e administrador do Concelho de
Soalhães, jurou que prenderia Zé do Telhado, estivesse onde estivesse. Solicitou
ao Governador Civil do Porto, Visconde de Podentes, um alvará que lhe
permitisse entrar nos concelhos vizinhos para prender o salteador e a sua
gente, o que lhe foi concedido. Simultaneamente envolveu os seus primos António
Nogueira Soares, Afonso Joaquim Nogueira Soares e Rodrigo Nogueira Soares,
notáveis personalidades do movimento da Regeneração, na necessidade de criar um
concelho que agregasse as comarcas vizinhas por forma a desenvencilhar as
autoridades dos empecilhos burocráticos, que não permitiam à justiça de uma
comarca entrar noutra, sem autorização do seu administrador.
Pelo
Decreto de 31 de Março de 1852, D. Maria II satisfaz a vontade de Adriano José
de Carvalho e Mello e cria o Concelho do Marco de Canaveses.
No
artº 1º estabelecia: “São reunidos num só concelho, os concelhos de Soalhães e
de Benviver”. E no artº 2º dizia-se: “O novo concelho passa a ser
denominado Marco de Canaveses” e os seus habitantes marcoenses.
Adriano
José de Carvalho e Mello era um devoto de Nossa Senhora da Natividade (protetora
da maternidade e do aleitamento). A
Divindade terá aparecido num penedo do
lugar conhecido por Castelinho onde se construiu, em tempos muito antigos, uma
Ermida. Diz-se que no penedo ainda há marcas dos pés da Virgem, onde “não pega
o musgo, nem a muinha”.
Um
dos sonhos de Adriano José de Carvalho e Mello era transformar a Ermida num
Santuário semelhante ao Bom Jesus de Braga (símbolo do sucesso da Restauração:
libertação de Portugal do jugo espanhol), onde trabalhou, como como santeiro, um marcoense ilustre, Monteiro da Rocha, irmão de uma das personalidades mais famosas no sé. XVIII, o Padre José Monteiro da Rocha, astrónomo. lente na Universidade de Coimbra, natural de Canaveses.
Já como administrador do Concelho fundou, com esse sentido, a irmandade do Castelinho e procurou que a devoção à Nossa
Senhora do Castelinho se tornasse num símbolo da proteção divina, da
regeneração e do patriotismo. A cumprir essa intenção, ainda hoje os
combatentes têm um encontro anual no Castelinho.
Faleceu,
sem ver satisfeita a sua vontade de consagrar o Concelho do Marco de Canaveses
a nossa Senhora do Castelinho.
As
figuras do núcleo da União Nacional pretenderam tornar feriado municipal o dia
28 de Maio. Mas a política do governo tinha, como princípio, fazer dessa data um feriado que representasse
o espírito de corpo da nação e, por isso, tornou ilegal qualquer marcação de
feriados concelhios nessa data.
No
dia 22 de Setembro de 1949, o recém-nomeado presidente do Concelho, Dr. Cabral
de Matos, dentro do espírito do Fundador do Concelho, faz aprovar em reunião da
Câmara, a consagração do Marco de Canaveses a Nossa Senhora do Castelinho e é
fixado o dia 8 de Setembro (dia da celebração religiosa), feriado municipal.
No
dia 12 de Setembro de 1957, o ex-libris do Marco, o seu Jardim Municipal,
recebeu, com pompa e circunstância, o busto do Fundador do Concelho, custeado
por uma subscrição pública. Não era para ser aí colocado, mas em frente ao
edifício da Câmara, como seria, por direito, o seu local próprio. Assim
pensavam os marcoenses que defendiam que o Jardim Municipal, sendo pensado à
imagem das “Cidades-jardim” (uma ideia romântica defensora do bem-estar e
qualidade de vida) pelo presidente Dr. Cabral de Matos, notário no Concelho e
natural de Mangualde, deveria honrar a sua memória, recebendo o seu nome. Nas contendas políticas da altura ganhou a fação contrária a esta ideia. O busto de Adriano José de Carvalho e Mello foi, em festa, colocado no Jardim Municipal e a inauguração da obra do Dr. Cabral de Matos foi sendo adiada, acabando por ficar esquecida até ao nosso tempo, talvez para não lembrar o seu obreiro. Mas o Jardim, mesmo sem ser inaugurado, foi incorporando diferentes inaugurações, afirmando-se como uma das melhores referências do Concelho.
quarta-feira, julho 25, 2018
Pais da democracia?
Esta
ideia do Prof. Dr. Marcelo, nosso Presidente da República e dos afetos,
justificar a ida de Mário Soares e de Sá Carneiro para o Panteão (lugar dos
deuses) por serem os pais da democracia, deixa-me perplexo!... Respeito muito
esses senhores, mas chamar-lhes pais da democracia é que não me parece bem.A função edificante
da história apareceu nos nossos primeiros livros, alimentou mentiras, criou
mitos, fez nascer meias verdades, foi tendenciosa e predispôs-nos para ter como
certo que a nossa pátria é a melhor de todas as pátrias, os nossos generais os
mais valentes de todos os generais, os nossos governantes os que sempre tiveram
razão e o nosso povo o que devia ficar-lhes sempre muito grato, mesmo que o
espoliassem e muito mal o tratassem.
É com esta história
que faz sentido os pais da democracia! Mas a História que nos traz os pais da
democracia tem um efeito hipnótico! Faz luz só para um lado e deixa na sombra,
rejeita ou atira para a escuridão do esquecimento a outra parte, a dos que
morreram nas prisões, foram perseguidos, perderam emprego, deram as mãos em
manifestações proibidas e criaram aquelas circunstâncias que fazem acabar com
as ditaduras. Se eles não são os pais, são, pelo menos, as sementes que fizeram
surgir a primavera da nossa vida coletiva. E não há pai para eles!
E os Capitães de Abril que, saturados de uma guerra sem fim, interpretando o sentimento das multidões que fizeram as manifestações perderam os filhos nas guerras e nesse dia subiram para os tanques bélicos, cravaram-lhes cravos e nas bocas das metralhadoras, ficarão órfãos?
http://www.tvi24.iol.pt/politica/marcelo-rebelo-de-sousa/marcelo-diz-que-sa-carneiro-e-mario-soares-merecem-panteao-sao-pais-da-democracia
E os Capitães de Abril que, saturados de uma guerra sem fim, interpretando o sentimento das multidões que fizeram as manifestações perderam os filhos nas guerras e nesse dia subiram para os tanques bélicos, cravaram-lhes cravos e nas bocas das metralhadoras, ficarão órfãos?
sexta-feira, junho 22, 2018
Extrema-direita
Os meus amigos, uma grande maioria de esquerda, sempre que lhes falo do que está a acontecer no Sporting, respondem-me: “Isso é lá com eles!” Continuo a pensar que o que está a acontecer com esse clube é paradigmático do avanço da extrema-direita, que entra pelo futebol, que é, talvez, o grande palco dos políticos e da política. O caso Bruno de Carvalho deveria pôr-nos, a todos, a pensar. É um exemplo típico duma relação fascista, troglodita, entre um líder e os seus seguidores. Essa relação baseia-se em ressentimentos, medos, condicionamentos de emoções, num despotismo patriarcal que constroi inimigos! Nada, mesmo nada, tem a ver com princípios racionais, democráticos, respeito pelo normal funcionamento das instituições e até de civismo. O caso é mais perigoso do que muita gente pensa! Bruno de Carvalho não está sozinho: acompanham-no os que não acreditam na lei, nos princípios e nos valores democráticos. Bruno de Carvalho, com o seu autoritarismo troglodita, tornou-se o líder dos fora-da-lei. E estes são todos os cansados da democracia formal, feita de palavras e com pouca substância na resolução dos problemas dos mais marginalizados pelo poder. Não tenham dúvidas!!!
segunda-feira, abril 30, 2018
Viva o Primeiro de Maio!
Viva o Primeiro de Maio!
Vivam os trabalhadores que em Chicago no
primeiro dia de Maio, em 1886, levantaram bem alto a luta pelos seus diretos,
nomeadamente de 8 horas de trabalho diário. Honremos os que morreram nessa luta
e todos os que ainda hoje são mortos por defenderem que não há trabalho sem
direitos.
Hoje o capitalismo não é idêntico ao de
1886. Perdeu o rosto e tornou-se financeiro e global. Mas o trabalho sem
direitos ou com poucos direitos regressou com os recibos verdes, o trabalho temporário,
etc.
Precisamos de refletir sobre a miséria
imerecida do nosso tempo! Os ideais do Primeiro de Maio precisam de se ajustar
aos novos tempos do imperialismo financeiro global, que, num darwinismo social,
torna os ricos cada vez mais ricos e em menor número e os pobres cada vez mais
pobres e em maior número.
Comemorar o Primeiro de Maio sem uma
reflexão sobre os novos problemas que se colocam ao mundo do trabalho é
esvaziar o sentido deste dia. Oxalá que os discursos de amanhã não sejam tão
longos como repetitivos. Oxalá que amanhã se honre a luta dos que deram
dignidade a todos os que vivem do valor do seu esforço físico.
Viva o primeiro de Maio!
segunda-feira, abril 23, 2018
25 De Abril
A Associação dos Amigos do Concelho do Marco de
Canaveses comemorou o 25 de Abril. Este ano, tivemos de fazer a festa no dia 21
de Abril. O Capitão de Abril Rodrigo Sousa Castro só podia estar entre nós
neste dia. Depois de um almoço de convívio e do nosso capitão de Abril assinar
o livro de honra da nossa Associação, decorreu a palestra no Auditório
Municipal, com a presença do vice-Presidente da Câmara. É muito difícil falar
desta comemoração, quando um Capitão de Abril nos faz sentir por dentro o seu
testemunho, numa linguagem simples, sem floreados. Lembrou-nos alguns episódios
completamente ignorados pela história da Revolução dos Cravos, nomeadamente da
dificuldade em comunicar com o coronel Corvalho por avaria no intercomunicador
de sua casa e dois jovens a quem dera boleia para Lisboa, solicitando-lhes que
a essa hora da noite, duas da manhã, não o deixassem dormir. Serviu-se do
powerpoint para nos dar conta dos febris passos que acompanharam o decorrer da
noite de véspera, em que tudo deveria ficar pronto para que ao som da Grândola
Vila Morena se abrisse o caminho da luz da madrugada de Abril, a que nos
trouxera a afirmação da nossa dignidade colectiva, a democracia e nos
permitisse perder o medo de usar da liberdade.
É difícil falar sobre esta comunicação do Capitão de Abril Sousa Castro,
tão viva, confessando o desfilar de um sofrido sonho sem sono, que nos fez
sentir a verdade imensa que há neste poema de Sophia.
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
Sophia de Mello
Breyner Andresen
sexta-feira, abril 13, 2018
Comemoração do 25 de Abril
- A Associação dos Amigos do Marco, vai, como é habitual, comemorar o 25 de Abril.
Este ano as comemorações vão efectuar-se no dia 21 de Abril (sábado) através de uma sessão solene a realizar no Auditório Municipal e que contará com a presença do Coronel Sousa e Castro, Capitão de Abril e Membro do Conselho da Revolução.
É uma oportunidade para conhecer e conviver com um dos homens fortes do Movimento das Forças Armadas que em 1974 derrubou a ditadura de Salazar e Caetano e devolveu a liberdade ao nosso País.
Antes da sessão solene, pelas 13h00 vai realizar-se um almoço comemorativo no Restaurante Magalhães, nesta cidade.
A AAM CONVIDA TODOS OS MARCOENSES A ASSOCIAREM-SE A ESTE ACTO, QUE TERÁ ENTRADA LIVRE NO AUDITÓRIO MUNICIPAL A PARTIR DAS 16H00.
segunda-feira, abril 09, 2018
Convém não esquecer isto!
Portugal foi para a Guerra para não perder as colónias cobiçadas, na altura, pelos ingleses e alemães. Escrevi com o saudoso amigo Coronel Virgílio Barreto Magalhães um livro sobre um nosso conterrâneo, combatente e médico nessa Grande Guerra: “Fernando de Miranda Monterroso, O Homem, O Herói e o Benemérito”.
Quisemos fazer a memória deste Homem bom pela seguinte razão: Este homem bom, herói de guerra e benemérito da nossa terra estava praticamente esquecido e até a sua foto tinha desaparecido do Asilo que a expensas suas tinha criado no Marco. Este Militar deixou grande parte da sua fortuna à Misericórdia do Marco e criou três bolsas de estudo, que serviram de exemplo a que outras fossem criadas pela autarquia.
Sobre a Batalha de La Lys, deixamos escrito o seguinte:” Esta incursão (dos alemães), desenhada numa situação de desespero, teve como seu arquitecto, o General (alemão) Erich Ludendorff. Concebeu-a para ser em grande escala, aterradora, feita de rompante, em massa e numa altura que pudesse surpreender o lado mais frágil das tropas luso-inglesas que ocupavam a Flandres. Deu-lhe o nome de “operação Georgette”, e entregou o seu comando ao General Ferdinand von Quast.
Esse lado era o que estava a cargo das tropas portuguesas, praticamente abandonadas por Portugal, depois do golpe de estado, com que Sidónio Pais tomou conta do poder, prendendo Afonso Costa, chefe do Governo, e exilando o Presidente da República.
(…)
Por volta das 4h15m da madrugada desse dia, arrancou, de surpresa o ataque. Mais de um milhar de bocas de fogo dispararam sobre a frente ocupada pelas tropas portuguesas e o seu impacto foi sentido como um terramoto horrendo e inimaginável, abrindo crateras com mais de 20 metros de diâmetro que engoliam soldados e armamento.
Este ataque intenso, massivo e em profundidade foi feito com oito Divisões (cerca de 55mil homens) numa primeira linha, cinco na segunda e três na terceira. Teve como alvo o 11º Corpo Britânico e o CEP que, como sabemos, ocupavam uma área de 55 km de frente, entre as localidades de Gravelle e de Armentiére. Mas o grosso do ataque fez-se contra o sector considerado mais débil, o ocupado pela 2º Divisão das tropas portuguesas.
A resistência em linha, como era a das trincheiras, sem capacidade de mobilidade, cedeu e as forças alemãs romperam o flanco esquerdo da defesa portuguesa, onde se fazia a ligação entre as forças das tropas comandadas pelo general Gomes da Costa e as forças britânicas da 40ª Divisão.
(…)
Por volta das 8h30m já não havia praticamente combatentes portugueses na primeira linha e a “avalanche” avançou como um rolo compressor sobre a linha B, atingindo rapidamente a zona das aldeias. Tudo foi feito com violentíssimos bombardeamentos de artilharia e ataques de gás que destruíram a 1ª e a 2ª linha de infantaria e cortaram as comunicações telefónicas e telegráficas.
As explosões de granadas e obuses passaram a atingir os comandos das brigadas, as posições da artilharia da Segunda Divisão do CEP, inclusivamente o seu Quartel-general.
A “chuva de metralhada”, como lhe chamou Augusto Casimiro (um poeta com o posto de capitão, natural de Amarante) no seu livro “Calvário da Flandres”, arrasou tudo e todos. O intenso fogo, o bombardeamento dos aviões e as granadas de gases foram pondo fora de combate milhares de militares.
Apesar da resistência heroica, foi impossível aos soldados portugueses, sem reforços, suster aquela “avalanche” de “boches”, com melhor armamento e em quantidade abissalmente superior.
Quem não morreu nem se entregou, entrou em pânico numa fuga desesperada e sem norte. Em apenas quatro horas de batalha, o general Costa Gomes perdeu 7.500 soldados, entre os quais 327 oficiais e cerca de 100 peças de artilharia.
A própria coordenação dos serviços de saúde tornou-se impossível. Não se conseguia formar uma coluna automóvel de transporte de feridos: o fogo inimigo tinha destruído a maioria dos veículos e os que restaram estavam avariados.
Neste contexto, o Cirurgião-Médico, Dr. Fernando Monterroso, mais uma vez, demonstrou ser um oficial corajoso, proficiente e determinado. Podia-se dizer dele o que disse Ferreira do Amaral (um oficial de carreira que também tinha estado em África e comandou na Flandres os soldados de infantaria de Tomar, Faro e Penafiel) numa indirecta aos oficiais pretensamente patriotas: “Não resolvi ir de repente, no entusiasmo dos vivas e excitado pelo som dos clarins e trombas da guerra, mas por dever de militar".
Nessa altura, Fernando Monterroso, chefiava os Serviços de Saúde da 2ª Divisão sediado em Lestrem e recebeu ordem do comando do XI Corpo do Exército Britânico para se deslocar para Saint-Venant.
Como não conseguiu transporte para essa deslocação e é informado que não há garantias para que em tempo oportuno o consiga, fê-lo a pé e envidou todos os seus esforços para reunir todos os que foi possível encontrar feridos, desorientados ou em debandada.
(…)
Como reza a justificação para ser galardoado com a medalha da “Batalha de La Lys”, a sua decisão salvou muitas vidas, foi considerada heróica e contribuiu para levantar o nível moral das tropas”.
A catástrofe de La Lys, com as suas consequências, as inúmeras perdas de combatentes e humilhações sofridas, transformou-se num pesadelo que fez esquecer no CEP todas as glórias do passado recente na Flandres. E elas não foram poucas!...
(…)
Este sentimento de frustração gerava mágoas profundas, de difícil cura, que eram sempre acompanhadas de queixumes: nas cantinas, nos gabinetes, em todos os locais onde conviviam combatentes, não faltava o dedo acusatório virado para Sidónio Pais, para os “cachapins (os beneficiados da guerra), os ingleses e os oficiais que aproveitavam vir de gozo de licença a Portugal e depois obtinham a desmobilização, com base no decreto nª 3959 de 30/03/1918, conhecido pela lei do “roullement”.
A substituição, ao fim de um ano, das tropas mobilizadas para a Flandres nunca aconteceu. O governo português de Sidónio Pais foi o único que, nas palavras do subchefe do estado-maior do CEP, coronel Ferreira Martins, “infligiu aos seus soldados o suplício intraduzível de lhes dizer que estão ali para sempre até que um tiro, um estilhaço ou uma tuberculose os tire dessa guerra, cuja duração ninguém podia prever”.
Compreendia-se, por isso, que nos duros rostos dos soldados portugueses desaparecessem os apegos que lhes faziam enaltecer a sua pátria e sentir orgulho em cumprir um dever patriótico. Vivia-se, agora, um profundo sentimento de ingratidão, tratamento arbitrário, humilhação, sofrimento e tristeza.
Chegavam-lhes, ao arrepio da censura, notícias da epidemia do tifo e da gripe, também conhecida por gripe espanhola ou pneumónica, que semeavam a morte em Portugal, mas nem isso superava a dor do abandono a que tinham sido votados, a consciência de que já não eram um corpo expedicionário, mas restos esfrangalhados de baterias, companhias e batalhões que, por ordem dos ingleses, eram dispersos por diversas unidades britânicas.
Humilhados pelos britânicos e traídos pela Pátria, em nome da qual eram soldados portugueses que morriam, ficavam mutilados física e psicologicamente, encarcerados ou desaparecidos, sentiam a sua alma de combatentes dizer o que escreveu o Coronel Ferreira do Amaral: “Sidónio Pais tratou-nos como gado de pastagem em montado”.
Foi neste contexto que Fernando Monterroso desabafou numa carta a Francisco Moreira de Magalhães, foi o de ter de reviver os locais e as situações que obrigaram a enterrar à pressa soldados tombados na batalha e assistir à morte inútil dos que foram incapazes de resistir aos ventos frios e húmidos da Flandres, que, com tosses intermináveis, lhes roubava a vida, sem ter ninguém, de perto, a valer-lhes”.
A Batalha de La Lys tem um lado que as comemorações esquecem: a traição dos políticos portugueses daquele tempo aos homens que, ao darem a vida pela sua pátria, deixaram as suas famílias cobertas de preto e muitas vezes na miséria.
É bom não esquecer isto!