segunda-feira, agosto 26, 2013

 

Os candongueiros da "Res-pública"

Escrevi para o Semanário Grande Porto o seguinte texto que espero que seja publicado na próxima edição: Os candongueiros da “res-publica”. A questão da limitação de mandatos é, sobretudo, uma questão de respeito pela natureza essencial da democracia. Todos, em democracia, têm o direito de exercer a direcção dos assuntos da “res-publica” e, cada um, por sua vez. É isso que pressupõe a limitação do mandato do presidente da República. Por que haveria de ser diferente para com os autarcas? Será que os autarcas podem apropriar-se do cargo, ainda que sujeitos à mobilidade territorial? Alguns candongueiros da política, sempre interessados nas mistelas e não no sentido da república, procuram “dar a volta” à lei, traduzindo “cargo” por “lugar”. Com isso, pretendem argumentar que os dinossauros do poder local podem mudar de lugar, candidatando-se num outro território ao mesmo cargo. Desvirtuam assim o direito de todos (e não alguns) tomarem parte na gestão direta dos assuntos públicos. Naturalmente, para que este direito se possa exercer é necessário abrir vaga, impor limites ao desempenho do cargo pelos mesmos, para que ninguém se torne vitalício num cargo, retirando oportunidades a outros. É preciso abrir espaço e, no limite, evitar que se constitua uma oligarquia de senhores que se revezam na ocupação dos mesmos cargos. Alguns sofistas dizem-nos que a decisão da limitação deve caber ao povo. Mas há alguma relação direta entre eleitor/ candidato? São os partidos que escolhem os candidatos e é nos partidos que os eleitores votam. Nem sequer há o voto uninominal! Mas, mesmo que assim fosse, o princípio da igualdade de oportunidades e da universalidade de direitos tinha que ser respeitado. Se todos têm o direito de tomar parte na direcção dos assuntos da “res-publica”, por que haveriam de estar sempre a passar à frente o samaritano de ocasião Filipe Meneses, o futeboleiro Fernando Seara ou o detetive Moita Flores? Há uma outra razão para limitar mandatos: a da higiene cívica. Sem limitação de mandatos não há possibilidade de criar condições que possam travar a formação de relações promíscuas entre empreiteiros, clubes de futebol, empresários e autarcas. Nem há possibilidade de desencorajar as redes de clientelismo que o aparelhismo e o carreirismo desenvolvem à custa dos lugares que, nos municípios, são criados para os boys. E muito menos se pode combater a falta de transparência nas decisões urbanísticas, a corrupção, o caudilhismo, o populismo, o fulanismo, etc. Será que é razoável aceitar que os vícios de clientelismo, tráfico de influências, esbanjamento de dinheiros dos contribuintes, etc., adquiridos num cargo não constituem problema, desde que o autarca mude de local, os leve para outro território?!... O espetáculo que está a ser dado pelos diretórios partidários que defendem que a limitação de mandatos só se aplica ao local do cargo, podendo os autarcas andarem de território em território, numa espécie de cargo vitalício com mobilidade geográfica, é não só obsceno, como demonstra bem a tentação oligárquica que domina os diretórios partidários. O poder local saído do 25 de Abril inspirou-se no municipalismo proclamado por Alexandre Herculano: “um governo local feito por munícipes para os munícipes”. Como seria bom que nessas lojas maçónicas tão frequentadas por esses partidos, se lesse a carta que o historiador-maçon escreveu aos eleitores de Sintra!...

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