quinta-feira, abril 21, 2011

 

25 de Abril, bem longe do 25 de Abril

Enviei para o Semanário Grande Porto o seguinte texto:

«Ao 25 de Abril aconteceu-lhe um pouco o que aconteceu a Camões: a falar de Camões muitos tornaram-se ricos e poderosos, enquanto o poeta morreu abandonado e na miséria.
É certo que não vivemos amordaçados por uma ditadura. Mas isso não significa que podendo falar e, vivendo em democracia, os cidadãos possam fazer ouvir a sua voz, lutar contra a impunidade que grassa no poder político e participar nas questões políticas que directamente lhes dizem respeito.

Hoje, só influencia politicamente quem tem poder económico e os que vivem do seu trabalho estão tão abandonados como está o espírito de Abril.
A distância que nos separa de Abril é já quase incomensurável. Estamos hoje quase na bancarrota e nenhum governante é responsabilizado por ter esbanjado o dinheiro dos contribuintes. E não se trata de apenas esperar uma punição no acto eleitoral. O esbanjamento dos dinheiros públicos é um crime que deveria ser julgado, como um roubo, pelos tribunais comuns.

As promessas eleitorais devem ser compromissos de honra e o dinheiro dos contribuintes não pode ser o saco azul das megalomanias, dos gabinetes de amigos, da multiplicação de serviços, do espavento político, das administrações milionárias de empresas do Estado falidas e de todo esse novo-riquismo que vai proliferando desde os últimos anos.

As comemorações do 25 de Abril têm-se reduzido a manifestações de rua. Sem retirar este carácter de festa popular, torna-se cada vez mais necessário aproveitar o “dia da Liberdade” para uma reflexão sobre temas que interessem à democracia e a todos os cidadãos.
Vivemos, hoje, uma profunda crise que nos vai atirando para a bancarrota. Ela tem raízes não só na forma como se organiza o capitalismo financeiro internacional, mas também na forma como se organizam os partidos, na falta de lideranças fortes, na fulanização da política, no esvaziamento do carácter moral de governar, numa profunda crise das instituições e na ausência de sentido de Estado. Por que não discutir tudo isto? Os partidos parecem orientar-se por lógicas muito semelhantes às mafiosas e isso reflecte-se na forma como entendem as instituições, o poder, o governo e os dinheiros públicos.

Se o regresso à ditadura de tipo fascista não parece pensável, vivemos hoje uma democracia doente, dominada por uma oligarquia que tomou conta do Estado.

Sem uma profunda reflexão sobre o papel dos partidos que os obrigue a responsabilizarem-se pelos maus governos que geram e sem responsabilidades criminais sobre o mau uso dos dinheiros públicos, é impossível fazer da democracia um regime orientado por uma ética da responsabilidade.
E é isso que nos falta».

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