quinta-feira, março 31, 2011

 

«A crise e a ausência de esperança

Escrevi para o Semanário Grande Porto o seguinte texto:


«No diálogo entre Sócrates (o Filósofo) e Górgias, que Platão transcreve com o nome do sofista, é questionado o valor ético-político da retórica.


Nesse texto, podemos encontrar, curiosamente, duas ideias que se podem aplicar à crise económica e social que, hoje, vivemos.


Por um lado, ficamos a saber que o desenvolvimento da retórica, como arte de construir argumentos com o objectivo de fazer acreditar em ilusões, provocou a decadência de Atenas e o desmoronamento das convicções ideológicas; por outro lado, o direito ao uso da palavra significou a primeira expressão da democracia.


Na verdade, não há democracia sem direito ao uso da palavra. Por que será, então, que a democracia (único regime que se opõe à tirania) se desmorona com o que faz parte da sua essência -- a retórica?


Platão, no “Górgias”, dá-nos uma explicação: a construção de argumentos obedece a regras, nomeadamente ao princípio da não contradição, e está aberta à refutação ou, como outros dizem, ao contraditório.


Uma retórica que se transforma apenas numa técnica de simulação, que pretende esconder a verdade com insinuações, que não se sujeita as regras do debate nem ao contraditório, é uma deriva da manipulação e da propaganda. Visa apenas impor um pensamento único e rompe com o contrato que pressupõe o pluralismo no exercício do debate democrático.


Além disso, a vida de uma comunidade exige a promoção de sentimentos de confiança entre instituições, agentes políticos e sociedade civil; e nenhuma crise económica ou social poderá ser resolvida sem a convergência de esforços gerada pela coesão social.

A crise que todos nós sentimos já não é só o resultado da má gestão do governo, nem da crise mundial: é também a consequência de uma forma de fazer política que perdeu o sentido do rigor e do serviço público. E esta ligeireza enraíza no facto dos partidos se tornarem grupos de interesses, onde predomina o caudilhismo, a ausência de regras e a falta de debate. Ora, nada disto pode gerar lideranças fortes e com sentido de Estado.

Com tais condições, o pensamento único, o economicismo, como perspectiva única de encarar os problemas, não abre espaço a formas mais justas de resolver a crise e promover desenvolvimento económico.

A inflação e o desemprego crescem assustadoramente, o País vai-se endividando e para pagar as suas dívidas impõe impostos de forma desumana e, por vezes cruel.

Haverá daqui a poucos dias novas eleições, mas o receio de uma alternância, sem mudanças nas políticas que propiciem um BOM-GOVERNO (que diminiu o sofrimento dos que mais sofrem), vai criando nos portugueses o desespero e a descrença nas instituições e tornando o Futuro das novas gerações cada vez mais negro».

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