quinta-feira, outubro 21, 2010

 

O pântano

Escrevi para o semanário Grande Porto, que se publicará amanhã, o seguinte texto:

Não é só o descalabro financeiro e económico que denuncia o pântano em que vivemos. É também a crise moral do sistema político. O divórcio entre eleitos e eleitores está quase a entrar em ruptura, pondo em causa o próprio sistema democrático.

O que se passou com a Distrital do PS de Coimbra e a forma como entende esse episódio o Secretário do PS, é paradigmático.


Perguntado a Sócrates qual a sua opinião sobre a eventual “chapelada” que terá dado a vitória ao seu ex-assessor, o Primeiro-ministro e Secretário-geral do PS responde: “o que se passa no PS só ao PS diz respeito, mas não deixo de lhe dizer que é preciso saber perder”.


A achega de Sócrates é reveladora do seu conceito de democracia. Para o Primeiro-ministro, o seu partido é uma ilha fechada, sem as paredes de vidro que obriguem à transparência e ao respeito por regras. Se, no seu entender, “é preciso saber perder”, sem discutir causas, presume-se que o inverso também seja verdadeiro. Isto é, todos os meios são legítimos para ganhar.

E o percurso do líder do PS é testemunho dessa forma de conseguir sucesso. Começou por ser um desconhecido engenheiro técnico que projectava mamarrachos na Cova da Beira, em seguida tornou-se um político associado ao polémico Freeport, fez-se engenheiro à velocidade da luz na controversa U.I. e, com uma lábia invejada pelos melhores feirantes, acabou por ser escolhido para Primeiro-ministro. O seu ex-assessor de Coimbra apenas procurou tê-lo por referência.

Max Weber, (“O político e o cientista”), identificou dois tipos de partidos: partidos de patrocinato que se caracterizam pela ausência de compromissos morais e objectivos claros, dominados por sindicatos de voto; e partidos de princípios que se organizam em torno de ideais e projectos. Possuem um ethos que estimula a coerência, censura o oportunismo e promove lideranças de mérito, interessadas em avaliar as consequências da acção política para evitarem efeitos indesejáveis.

Só uma cultura de mérito pode gerar partidos de princípios e só eles têm capacidade para evitarem descalabros de governação que levam a situações de bancarrota.

Para promover uma cultura de mérito nos partidos, basta que seja reconhecida dignidade ao voto em branco. Quem vota em branco, acredita na democracia, mas não encontra quem o possa representar com credibilidade.

O sistema eleitoral deveria ser alterado para que o voto em branco fosse contado na distribuição proporcional, como se se tratasse de votos numa “não-representação” a que corresponderia cadeiras vazias no parlamento.

Mas esta reforma só será possível pela mobilização da sociedade civil.

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