sexta-feira, abril 30, 2010

 

"Primeiro de Maio: dia de luto e de luta

Publica-se, hoje, no Semanário Grande Porto, o texto que escrevi:

Primeiro de Maio: dia de luta e de luto

Vivemos, hoje, o 1º de Maio num contexto que faz lembrar o que deu origem ao que o Papa Leão XIII, em 1891, denominou “Questão Social”.

O conceito denunciava uma injustiça social responsável por uma “miséria imerecida”, como lhe chamou o Papa.

Por essa altura, a Revolução Industrial havia gerado um conflito entre o capital e o trabalho e a greve geral do primeiro de Maio de 1886 tinha levado para as ruas de Chicago milhares e milhares de trabalhadores para protestarem contra o desemprego e as condições desumanas a que estavam submetidos no trabalho. Houve prisões, feridos e alguns líderes foram enforcados, acusados, como é da praxe, de arruaceiros, preguiçosos e não quererem trabalhar.

Hoje, vivemos um conflito de forma semelhante. Também, hoje, de forma imoral, se desenvolveu um sistema que tornou o lucro mais importante que o trabalho e o Estado de “bem-estar”, que nos garantia o PS de Sócrates, parece só providenciar pelos seus apaniguados mais chegados.

Não se estranha, por isso, que a CIP tenha o desplante de pressionar o Governo a abandonar o princípio de um limite mínimo de subsídio aos desempregados, cerca de 420 euros, para os forçar a aceitar um emprego por qualquer salário e em quaisquer condições.

A profunda “miséria imerecida” que se vai configurando numa taxa de 11% de desemprego, no congelamento de salários e numa crise sem paralelo não tem a sua origem apenas numa crise do capital financeiro global.

É certo que a Banca, orientado pela suprema ganância do lucro, procurou rentabilidades, em roda livre, com a conivência dos políticos que desprezaram os sistemas de controlo da sustentabilidade do seu capital. A crise reflectiu-se depois nas empresas, sobretudo nas pequenas e médias e, consequentemente, no Estado. Mas logo que os governos ajudaram a Banca a ultrapassar a sua crise e, nalguns casos, a evitar a sua falência, imediatamente, tal como na “canção dos vampiros” passaram a chupar o sangue dos Estados com economias mais frágeis, com o aconselhamento das agências de rating.

Os Estados, sobretudo os que fazem parte da Europa, poderiam contrariar esta situação, colocando a política acima da economia. Não o fizeram e, também, não podemos atribuir apenas à crise internacional a pré-falência em que nos encontramos. O Estado português tem sido entregue (em função da lógica partidária que temos) a “chicos-espertos” e a corrupção campeia.

Para fugir ao controlo do Tribunal de Contas criaram-se empresas municipais, onde os “boys”, que por lá proliferam com ordenados escandalosos, gastam o que não podem, as autarquias de rotunda em rotunda, foram fazendo dívidas de milhões, as empresas intervencionadas preocuparam-se mais com os interesses dos administradores do que com preocupações sociais. Traçam objectivos de lucro com fabulosos vencimentos, prémios, benefícios fiscais associados a seguros, etc. e a receita é fácil: despede-se e precariza-se o emprego. Entretanto, a subida dos impostos vai asfixiando a vida da classe média.

As multinacionais que por aqui ainda resistem, estão a ver diminuídas as razões para continuar em Portugal, já que a incorporação do que entre nós é produzido está cada vez mais diminuída. De 60% de produtos nacionais, a Autoeuropa, por exemplo, já só incorpora 30%.

Temos um Governo que se deslumbra com o TGV, as auto-estradas e a energia eólica, mas parece despreocupado com a vida agrícola, as pequenas e as médias empresas.

Um darwinismo social vai tornando os pobres cada vez mais pobres e em maior número e os ricos cada vez mais ricos e em menor número.

Neste contexto, o Primeiro de Maio, que agora comemoramos, é mais de luta e de luto que de festa.

Temos de saber ser solidários na luta por um Portugal socialmente mais justo e, consequentemente, exigir as reformas, sobretudo dos partidos, que promovam a possibilidade de escolhermos políticos de mérito e com sentido de Estado.

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