sábado, abril 18, 2009

 

A propósito do Congresso dos Empresários e Gestores Católicos

Iniciou-se, hoje, um congresso de Empresários e Gestores Católicos. Por se dizerem católicos, naturalmente quererão dizer que o seu conceito de empresa é distinto de outros e que harmonizam os seus negócios com as suas crenças.

De facto, na doutrina social da Igreja Católica, encontramos referências sobre a actividade económica que são distintas, por exemplo, das que são, hoje, seguidas pelos neo-liberais.

No séc. XIII, São Tomás de Aquino enunciava dois princípios morais de justiça relativos à posse de bens na actividade económica: o princípio da justiça comutativa, segundo o qual o trabalhador tem direito ao salário justo e à participação nos lucros; e o princípio da justiça distributiva, para o qual os bens devem ser distribuídos em função das necessidades das pessoas e não na medida do mercado. Ou seja, em vez de resolvermos o problema da pobreza através do crédito, devemos corrigir as desigualdades sociais.

Estes dois princípios pressupunham a máxima defendida pela escolástica: “Os bens são de uns, mas são para todos”.

Mais tarde, perante a “questão social” que resultou da dramática crise provocada pela primeira Revolução Industrial, o Papa Leão XIII, na encíclica “Rerum Novarum” (15 de Maio de 1891), sublinhou a dimensão social da economia, fazendo uma distinção entre a “justa posse da riqueza” e o seu “legítimo uso”. Afirma que todos os bens da natureza pertencem a todos os homens indistintamente e, por isso, quem dispor de bens que suficientemente o satisfaçam deve disponibilizar o supérfluo para os que menos têm. E define como critério do legítimo uso dos bens a capacidade de promover a prosperidade e bem-estar de todos.

Reflectindo sobre o trabalho, diz que ele é um direito natural que “honra o homem, fornecendo-lhe um nobre meio de sustentar a sua vida e a da sua família”. Eleva o mérito do trabalho à condição de uma virtude que tem como referência da sua dignidade o modelo divino (Não é Ele o carpinteiro, o Filho de Maria?).

Associado ao valor do trabalho, a “Encíclica” refere o valor da solidariedade: “mais valem dois juntos que um só, pois tiram vantagem da sua associação. Se um cai, o outro sustenta-o. Desgraçado do homem só, pois; quando cair, não terá ninguém que o levante”. E conclui: “O irmão que é ajudado por seu irmão, é como uma cidade forte”.

Para fomentar o valor da solidariedade, aponta o associativismo, do qual os sindicatos e as associações patronais são um exemplo, e adverte que as desigualdades enraízam na avidez do lucro que gera conflitos de interesses antagónicos.

Atento à análise marxista, propõe a substituição da ideia de conflito entre classes pela ideia de concórdia fundada no valor da dignidade humana e no respeito pelos deveres mútuos: o dever do trabalhador desempenhar as suas tarefas de harmonia com contratos livres; e o dever do patrão não tratar o trabalhador como se este fosse uma peça descartável de uma engrenagem para ganhar dinheiro.

Os vínculos do trabalhador à empresa têm reflexos na construção da sua personalidade, no seu modo de se relacionar com a vida, os outros e o mundo, na sua auto-estima e nas suas relações familiares e sociais.

Por isso, a perda de emprego põe em questão várias referências da identidade do trabalhador, podendo conduzir a um processo de dessocialização progressiva, arrastando consigo um sofrimento que leva, muitas vezes, ao desespero e até ao suicídio, como tem ultimamente acontecido.

A importância da ética empresarial é incontornável numa economia que se queira humanizada. De uma forma cínica, muitas empresas utilizam os códigos de ética como estratégias de marketing.

Oxalá que este Congresso de Empresários e Gestores Católicos não fique pela retórica farisaica das nobres intenções, mas seja a demonstração de que os católicos entendem a ética como uma postura de vida e disso dão testemunho na forma como dignificam o trabalho, respeitam os direitos dos trabalhadores, acautelam o bem-estar das famílias dos mesmos e avaliam as consequências que, para o meio-ambiente, tem a actividade empresarial.

Se isso acontecer, este Congresso de Empresários e Gestores Católicos será o sobressalto cívico e humano que se espera neste momento de profunda crise.

Comments: Enviar um comentário



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?