segunda-feira, outubro 22, 2007
Livro do desassossego

Escrevo, triste, no meu quarto quieto, sozinho como sempre tenho sido, sozinho como sempre serei. E penso se a minha voz, aparentemente tão pouca coisa, não encarna a substância de milhares de vozes, a fome de dizerem-se de milhares de vidas, a paciência de milhões de almas submissas como a minha ao destino quotidiano, ao sonho inútil, à esperança sem vestígios. Nestes momentos meu coração pulsa mais alto por minha consciência dele. Vivo mais porque vivo maior. Sinto na minha pessoa uma força religiosa, uma espécie de oração, uma semelhança de clamor. Mas a reacção contra mim desce-me da inteligência... Vejo-me no quarto andar alto da Rua dos Douradores, assisto-me com sono; olho, sobre o papel meio escrito, a vida vã sem beleza e o cigarro barato que a expender estendo sobre o mata-borrão velho. Aqui eu, neste quarto andar, a interpelar a vida!, a dizer o que as almas sentem!, a fazer prosa como os génios e os célebres! Aqui, eu, assim!...
Fernando Pessoa/Bernardo Soares - Livro do Desassossego
Fernando Pessoa/Bernardo Soares - Livro do Desassossego
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Env. por Amélia Pais
Comments:
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Este era pobre mas não de espírito!
O país precisa de espíritos livres, capazes de se exporem e de porem a ridículo os que no seu sossego imundo vão chafurdando no vil metal quais Patinhas da nova era, gozando com volúpia o prazer sádico de terem tudo, de comerem tudo e... não deixarem nada...
Mas ainda bem que se descobriu esta marosca do Patinhas do Millenium!
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O país precisa de espíritos livres, capazes de se exporem e de porem a ridículo os que no seu sossego imundo vão chafurdando no vil metal quais Patinhas da nova era, gozando com volúpia o prazer sádico de terem tudo, de comerem tudo e... não deixarem nada...
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