terça-feira, julho 24, 2007

 

O mérito da ERC

O “Público” de ontem referia a nova jurisprudência do Direito de Resposta adoptado pela Entidade Reguladora da Comunicação Social. Sempre que uma notícia não está de harmonia com o que pretende o “produtor” do facto, este tem direito de resposta.

E o referido jornal trouxe o exemplo do copo meio cheio ou meio vazio. Se a notícia referir que fulano tinha na mão um copo meio cheio, isso pode merecer, segundo a ERC, o recurso ao direito de resposta: basta que o visado sustente que a expressão “meio cheio” atinge a sua reputação e, por isso, deve ser substituída por “meio vazio”. E pouco interessará saber se o visado cambaleava ou não, quando o copo ficou meio cheio ou meio vazio!

O conceito “reputação” recupera, pela própria decomposição da palavra, novas paternidades. Percebe-se, por isso, a justeza da nova jurisprudência.

Imaginemos o argumento da “reputação” na seguinte paternidade:

Foi noticiado que as Estradas de Portugal declararam que o número de vítimas, nas nossas estradas, “tinha baixado cerca de trezentos por cento”. Filha da boa reputação, as E.P. podem exigir que o jornal corrija, dizendo p.ex, que o que disseram foi que “em 100 sinistros não houve trezentas mortes”. E quando alguém lhes disser que o disparate continua, pode, em nome da sua reputação, voltar a usar o direito de resposta, esclarecendo, p. ex., que deve ser entendido que “os 100 sinistros eram com autocarros de passageiros”. E, se isso ainda atingir a sua reputação, podem continuar a usar o direito de resposta, até que as matemáticas batam certo.

Como se vê, não fazem sentido três acusações que já fazem à Entidade Reguladora da Comunicação Social: 1ª que fecha a notícia numa interpretação unívoca e transforma os jornalistas em meros recadeiros; 2º que desconhece as contribuições da semiótica e da hermenêutica contemporânea para o entendimento do contexto interpretativo; 3º que coloca no “produtor” dos factos a interpretação dos mesmos, tornando o direito de resposta num direito a torcer a notícia até a "lavar" dos disparates que cometeu.

Impõe-se, portanto, o reconhecimento do mérito da ERC e esperar que o Presidente da República o sublinhe.

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