quarta-feira, fevereiro 07, 2007

 

Fica-se perplexo!...

É, hoje, noticiado que um Juiz-desembargador foi objecto de um processo disciplinar, aberto pelo CSM, por ter considerado, num artigo de opinião, que a pena de seis anos de prisão atribuída ao sargento Luís Gomes foi «cega, brutalmente injusta e desproporcional».

Mas isso é o que diz toda a gente que valoriza um Pai do coração, inclusivamente D. Januário, Bispo das Forças Armadas. Por que não pode dizer um Juiz o que outros cidadãos dizem?!...

Os códigos de honra que, no interior de corporações, interditam a critica são próprios das sociedades fechadas e obscuras.

Na justiça, mais do que em outra qualquer instituição, é fundamental a crítica e a autocrítica às suas próprias medidas. É que a sua credibilidade depende, sobretudo, da seguinte interrogação: será que as nossas decisões conduziram a consequências injustas?!...

A resposta a esta pergunta terá de ser aberta, porque uma boa justiça deve saber reconhecer os seus próprios erros para os poder corrigir; e isso é impossível sem a disponibilidade para aceitar criticas no seu próprio interior e fora dele.

Comments:
Perplexo, é um eufemismo. E o que dizer desta outra , o juiz Hélder Fráguas foi substituído, esta quarta-feira, como juiz-presidente do 2º Juízo Criminal do Tribunal do Seixal, depois de ter sido suspenso preventivamente por ser o autor de um blogue que contém linguagem considerada obscena?!?!!
É caso para recomendar aos srs iluminados do C.S.M. esta leitura:
...«Repito que o fim do Estado ( CSM ) não é converter os homens de seres racionais em autómatos ou animais, mas deve antes visar que o seu espirito e o seu corpo se desenvolvam em todas as suas funções e que eles usem livremente da razão sem rivalizarem entre si através do ódio, da cólera ou do engano e sem se fazerem guerra sob a inspiração da injustiça. O verdadeiro fim do Estado ( CSM ) é, pois, a liberdade. » ( B. Espinosa, Tratado Teológico-Político.)
 
Enquanto a ciência se harmoniza com a democracia, uma vez que rompeu com o positivismo e defende a interdisciplinaridade que enriquece o debate e dá força aos melhores argumentos que corrigem erros e promovem o avanço na conquista da verdade, a justiça (impedida de critica e autocrítica) parece ainda estar numa concepção medieval de apropriação religiosa da verdade, onde qualquer divergência é tida como blasfémia (ou violação do dever de reserva) a merecer a fogueira do castigo.

Laborinho Lúcio, ao pedir que igual processo ao Juiz Rangel lhe seja movido, mostrou uma grande dignidade e um excelente sentido da justiça. (o que vale para um, deve valer para todos)
 
O Sr Conselheiro Laborinho Lúcio. É do mais lúcido que temos no pensamento juridico. É dos poucos que pensa a Justiça.Tive o privilégio de assistir a uma conferência por ele dada,realizada pelo Conselho Distrital do Porto da O.A.neste mês de Janeiro, intitulada « o Palãcio da Justiça », na qual afirmou « é que o que está em jogo, não é já a independência dos Tribunais, mas antes a sua capacidade para cumprirem, suportados numa ética de exigência democrática, as suas comlexas funções...temos hoje como seguro que é chamando ao compromisso comum e tornando públicas e trasparentes as respectivas acções ou omissões, que o politico e o judicial se colocarão em condições de responderem também pela credibilidade do sistema de justiça..»
 
E isso é evidente a quem teve um dia a necessidade de procurar justiça. Ela não só tarda, como é dada por vezes como uma lotaria. Nunca se sabe o que poderá ser decidido pelo Tribunal. Quando se chega a um tribunal, há sempre um denominador-comum:quando alguém bem vestido e muito novo chega muito tarde, todos dizem em surdina: chegou o juiz!
 
São os sinais dos tempos, meus amigos. Há poucos meses, tive de ir aí perto de vós ( melhor não dizer a Comarca - que tenho de lá voltar...cidade da Beira interior...) e tive de me confrontar com um Magistrado, no caso, Magistrada, muito nova mas...muito assertiva...creio que falta a experiência da vida...o bom senso, em suma...

Quanto ao referido blog, dei-lhe uma rápida vista de olhos, e não encontrei nada de obsceno. Apenas casos da vida real...será que a vida actual é que é obscena?
 
Não conheço nenhuma das situações que vieram a lume e ainda não tive tempo de ler o blog do Juiz Fraguas. Sobre este último apenas tive oportunidade de ouvir o noticiário da sic. E se o que ali ouvi é verdade, então tenho de dizer que alguma reserva e recato não lhe faziam nada mal, pelo contrário, recomenda-se.

Concordo com o primo quando refere que "Os códigos de honra que, no interior de corporações, interditam a critica são próprios das sociedades fechadas e obscuras." e que a resposta à pergunta "será que as nossas decisões conduziram a consequências injustas?!..." tem que ser aberta.

Mas isso não exonera os Srs Magistrados dos especiais e acrescidos deveres decorrentes das funções em que foram investidos. E neste particular aspecto sou muito critica de algumas posições e comportamentos que observo em alguns Magistrados. Não posso deixar de defender que um juiz deve terum comportamento irreprensível, ou pelo menos parecer tê-lo, e estar acima de qualquer suspeita seja ela de que índole for. Vou ouvindo não raras vezes, e para justificar alguns erros, que os juízes também são humanos. Sem dúvida. Nem eu pretendo desumanizá-los ou elevá-los à categoria de perfeitos, que sei não serem, mas, tal como noutras profissões e cargos, devem possuir perfil adequado e idóneo às funções que assumem. Ou seja, tal como nem todos podem ser pilotos de avião, p.ex., também não consigo deixar de defender que nem todos têm perfil para a magistratura na medida em que se espera deles, eu espero, comportamentos "acima" do cidadão comum. Aceito como natural facilidade erros técnicos, quem os não tem? Mas não aceito certas posturas nem certas declarações que me vou dispensar de aqui concretizar. Talvez eu seja mesmo retrógada, mas não consigo libertar-me da convicção de que há determinadas profissões que pela sua importância, responsabilidade, honorabilidade, etc, etc, não podem dar-se ao luxo de se comparar nos comportamentos e exposição a outras profissões ou de actuar como se não fizessem parte delas. Há limitações que fazem todo o sentido em função do papel social que desempenham e lhes cabe.
Já me alongeui demais. Remato com dois pensamentos que subscrevo e, por isso, ilustram o que penso:
“A missão do juiz é tão elevada em nossa estima, a confiança nele é tão necessária, que as fraquezas humanas, que não se notam ou se perdoam em qualquer outra ordem de funcionários públicos, parecem inconcebíveis num magistrado.”
(Calamandrei)
“Desgraçada da geração cujos juízes devam ser julgados".
(Talmude)
 
Sobre isto ainda me apetece perguntar:
O desembargador Rangel foi o único a pronunciar-se sobre o caso Esmeralda? Aos que tem memória curta aconselho uma leitura rápida pelos blogues dos Srs Magistrados. São muitos e estão ai ao acesso de quem tenha interesse. Estes também serão alvo de processo disciplinar pela violação de reserva?
 
Esta questão levanta muitas outras. Penso que o dever de reserva só pode ser justificado como medida cautelar na defesa de valores superiores ao direito à crítica. Mas repare: o CSM só coloca esta questão (dever de reserva) a quem discorda de decisões da corporação. Os juizes que se pronunciaram, de forma exaltada, a favor dessa mesma sentença ou na defesa dos privilégios de magistrados podem falar à vontade.

Veja o caso do sindicato dos magistrados. Abrem todos os trombones para defender os privilégios, não têm uma palavra sobre este problema. No entanto, deveriam até explicar o sentido do dever de reserva e dizer se neste caso se este dever se justifica ou não, se é ou não um travão aos direitos de cidadania que um magistrado também tem. Mas parece que os magistrados não têm verdadeiramente um sindicato, mas um cinturão protector de privilégios. E isso não é bom para eles!

O blog do Juiz Fráguas é o seguinte: http://www.fraguasonline.blogspot.com/
 
Já ouvir falar no princípio da oportunidade?
Eu já, só não sabia que podia servir de fundamento ao CSM no que concerne à decisão de instauração ou não de procedimentos disciplinares!!! Ou seja, se bem leio as coisas, aquele princípio sustentará a dualidade de critérios em matérias disciplinares!!
Estou perplexa.
 
O princípio da oportunidade é o princípio do bom-senso (e não do senso-comum). Liga-se às medidas acautelares.

Em relação aos deveres de reserva, penso que o CSM tem a mesma posição que os defensores do "Não" no referendo. Qurem que a liberdade de expressão não se oriente pelos deveres de consciência, mas pelo "braço armado" da instituição.
 
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