segunda-feira, novembro 13, 2006

 












Cenário
Eis a estrada, eis a ponte, eis a montanha
sobre a qual se recorta a igreja branca.

Eis o cavalo pela verde encosta.
eis a soleira, o pátio, e a mesma porta.

E a direcção do olhar. E o espaço antigo
para a forma do gesto e do vestido.

E o lugar da esperança. E a fonte. E a sombra.
E a voz que já não fala, se prolonga.

E eis a névoa que chega, envolve as ruas, move a ilusão de tempos e figuras.
- A névoa que se adensa e vai formando
Nublados reinos de saudade e pranto.

Cecília Meireles, em O Romanceiro da Inconfidência
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Enviado por Amélia Pais
http://barcosflores.blogspot.com/
http://cristalina.multiply.com/

Comments:
Muito lindo este poema, como de resto toda a poesia de Cecília Meireles. É uma das minhas preferidas, a par de Sophia de Mello Breyner.
A propósito da morte dos pais escreveu: "Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno que, para outros, constituem aprendizagem dolorosa e, por vezes, cheia de violência. Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade."
ln
 
Já tinha saudades de si. Obrigado pelo seu comentário. Respondi ao seu "piropo" no local do mesmo.
 
Não faça isso. Fez-me corar.
ln
 
A transcrição do despojamento de Cecilia Meireles marca todo o sentido da sua poesia. Também penso que Sofhia foi a maior poeta do séc. XX.
 
Sophia tem o Mar. E o Mar é para mim muito. Sento, desde sempre, um enorme fascínio pelo mar e, repare, quis o destino (ou eu)que vivesse longe dele. Penso até que é intencional, coloco-me, propositadamente, distante do mar como forma de aumentar o desejo e a ansiedade de lhe chegar.
Em Cecília fascina-me, sobretudo, aquela capacidade de transitoriedade das coisas. É impressionante e é uma inspiração pessoal. Por vezes, tento exercitar aquele desprendimento material, terreno, das vitórias e perdas...
Depois, alguém me sacode e eu acordo. Percebo, então, que sonhava. Sonhava que não vivia neste mundo...

ps: o seu desabafo foi amável, eu é que não o esperava, dai aquela reacção. Mas não só corei, também sorri de contentamento. Obrigada.
ln
 
"Sinto, desde sempre, ..."
 
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