sexta-feira, outubro 27, 2006

 

"Que valores para este Tempo?"

Texto 12

A consciência do absurdo

"Os deuses haviam condenado Sisifo a rodar uma rocha até ao cimo de uma montanha e uma vez atingido o cimo, a rocha regressava pelo seu próprio peso ao sopé da montanha, obrigando Sisifo a recomeçar o seu trabalho, sem cessar.
Haviam pensado (os deuses), com algum fundamento, que não há castigo mais terrível que o trabalho inútil e sem esperança. (...) Se o mito é trágico é, porque o homem, seu protagonista, tem consciência de que a esperança de atingir o propósito do seu trabalho é frustrada. Muitos profissionais do nosso tempo trabalham nas mesmas condições e o seu destino não é menos absurdo. Mas esta situação só é trágica nos momentos em que se tem consciência dela”. (texto adaptado)


A Camus. In: El mito de Sisifo, Losada, Hay ed. En Alianza. 1970, pp93-95.

Texto 13


O bom profissional

"O bom profissional é aquele que sabe trabalhar, aquele que não se rege por meros critérios de eficácia, que se não converte em peça da máquina. O exercício sábio da profissão leva consigo criatividade, mas exige um âmbito livre de realização e, portanto, responsabilidade.
A profissão é precisamente o modo como na sociedade actual se articula a participação das pessoas concretas. Vivemos numa sociedade profissionalista. Mas, muitas vezes, a profissão rege-se exclusivamente por critérios pragmáticos de eficácia, e o homem concreto transforma-se numa peça da grande máquina. Sublinhar o factor de criatividade que toda a profissão leva consigo, equivale a destacar o seu carácter livre e responsável. Uma boa preparação profissional - um estudo de qualidade - não será, portanto, um mero adestramento na aquisição de destrezas estereotipadas, mas deverá pôr a imaginação criadora e a capacidade de inovação. (...)
A palavra «profissão» evoca a capacidade de dar fé pública, de testemunhar: professa-se um modo estável de vida, manifestam-se umas capacidades de serviço dignas de confiança. É como que o rosto - persona - com que aparecemos em sociedade. Mas, se a profissão perde a sua inserção vital, converte-se numa máscara suscitadora de suspeitas acerca dos interesses que realmente esconde. (...)
O trabalho humano não tem só uma dimensão instrumental, de transformação das coisas materiais. Este é o resultado objectivo, que tem de ser iluminado a partir da sua radicação subjectiva. Antes de ser produção exterior, poesis, o trabalho é praxis: conhecimento interior do que se faz e decisão acerca do que se pretende.
A produção objectiva pressupõe a acção subjectiva. Este primado da dimensão subjectiva do trabalho sobre a sua dimensão objectiva deve traduzir-se na precedência valorativa da acção produtiva sobre os meios e resultados da produção. De tal maneira que saber trabalhar antecede a materialidade do próprio trabalho.
Saber e trabalho têm, portanto, uma intrínseca conexão. Saber trabalhar é conhecer o bom uso dos meios, em vista de fins preferidos. Repare-se que o próprio ser dos meios, enquanto tal, provém da sua inserção na acção humana"


Maria José Cantista. In. Racionalismo em crise. Livraria Civilização Editora, Porto,1984 pp128-133

Texto 14


O homem light

“As grandes transformações sofridas pela sociedade nos últimos anos são, ao princípio contempladas com surpresa, logo a seguir com uma progressiva indiferença ou, noutros casos, como necessidade de aceitar o inevitável. (...)
Das entranhas desta realidade sócio-cultural vai surgindo um novo homem light, produto do seu tempo. Se lhe aplicamos a luneta observadora descobrimos que dele fazem parte as características seguintes: pensamento débil, convicções sem firmeza, apatia nos seus compromissos, indiferença sui generis feita de curiosidade e relativismo ao mesmo tempo; sua ideologia é o pragmatismo, sua norma de conduta, o que todos fazem, o que se tolera, o que está na moda; sua ética fundamenta-se na estatística, substituta da consciência; sua moral, repleta de neutralidade, falta de compromisso e subjectividade, é relegada para a intimidade, sem se atrever a vir a público”


Henrique Rojas. In: O Homem light, Gráfica de Coimbra. p.9

Comments:
"O bom profissional" é de facto um bom diagnóstico e uma visão muito actual de como tendemos a encarar a profissão nos dias de hoje. Mas haverá outra forma? São, porventura, as regras do mercado e desta civilização, dita moderna, que impõem que assim seja.
Quem procura trabalho e precisa de ganhar o pão de todos os dias não pode, embora devesse, preocupar-se com uma criatividade e uma inovação que sente que não lhe pedem ou esperam dele. A preocupação é, penso eu, de agradar a quem lhes paga, de responder aos objectivos esperados...
Predomina, hoje, uma economia de resultado e de meios pragmáticos. Logo, o primado da dimensaõ subjectiva do trabalho sobre a dimensão objectiva é "coisa" equidistante da maioria dos trabalhadores por conta de outrém. São poucos os que se podem dar ao luxo de "saber trabalhar", conhecendo o bom uso dos meios.

O homem light também está excelente. Um retrato fidedigno de alguns dos homens de hoje. Mas, só alguns!! Ainda há por ai muito bom homem que não é light. Muito pelo contrário, é bem estruturado, mental e moralmente, e que se atreve a vir a público.

Por fim, a minha escolha: gostei sobretudo do texto 8 - Ética da convicção e ética da responsabilidade. Diz muito, ou diz tudo. Eu, no meu dia a dia, procuro agir daquele modo:convictamente e de forma responsável. As duas éticas complementam-se e concorrem na formação do "homem autêntico".
ln
Desejo-lhe um bom resto do fim-de-semana.
 
Obrigado. Agradeço-lhe ter prestado atenção aos textos. Quanto ao sentido da profissão eu penso que sob o ponto de vista ético (e é disso que se fala), quando o estdo reconhece uma profissão, reconhece que o profissional é competente para dar testemunho de um saber. E isso é a sua responsabilidade profissional.Muito mais do que agradar seja a quem for.

Um bom fim de semana também para si.
 
Eu pressupus que essa seria a sua resposta. (Sinto que começo a saber mais sobre si).
Ainda assim, entendi que devia realçar a vertente da necessidade de quem presta o trabalho, embora tenha ficado muito por dizer.
ln
 
Já coloquei o post e aguardei o seu comentário. Mas, amanhã estou bem cedo na serra, na "costa grande", junto a Baião,com o meu perdigueiro. Até amanhã e bom fim de semana.
 
oohhh!!
Mas eu comentei. E se o relógio estiver bem reparará que o fiz às 11.39 PM (anterior e este seu).
Pois é, amanhã é dia de "ocupação". Que inveja. Mas não sei caçar, não tenho arma, nem perdigueiro, nem amigos dessas aventuras. :-)
Passe um bom dia e cuidado com a chuva (que não haverá, segundo as previsões metereológicas)e, sobretudo, com as armas. Ocorrem por ai muitos acidentes.
Bom Domingo.
ln
 
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