quarta-feira, outubro 25, 2006

 

"Que valores para este Tempo?"

Texto 2.

Não há factos sem valores

Nem todas as culturas fizeram a distinção entre o homem e a natureza. Na Índia, por exemplo, ao contrário do pensamento ocidental, sempre se insistiu na unidade "homem-natureza".

Hoje, os problemas ecológicos tornaram evidente que o homem não vive separado da natureza. Edgar Morin, a propósito escreve: «o homem é um ser cultural por natureza, por ser um ser natural por cultura
[1]».

Não podemos dizer que os valores, embora independentes das coisas, não façam parte das próprias coisas, por três razões:

1ª – Os valores são referências para a interpretação dos factos. Os juízos de facto são feitos através da linguagem natural. E a linguagem em que aprendemos a dar nomes às coisas traduz um modo de pensar, uma cultura, um modo de ver o mundo. Não há cultura, nem modo de ver o mundo sem referências ao que chamamos valores. Com outro modo de pensar ou outra cultura, naturalmente teríamos outras referências e poderíamos interpretar os factos de outra forma. Por isso, não há factos sem interpretações e estas são sempre orientadas pelos valores da nossa cultura e do nosso modo de ver o mudo.

2ª - Sem valores não há factos. É esta a opinião de Putnam: “Sem os valores cognitivos de coerência, simplicidade e eficácia instrumental não temos nem mundo nem «factos», nem mesmo factos acerca do que é relativo ao quê, porque esses estão no mesmo barco que todos os outros factos. (...) Toda a actividade que se eleva acima do hábito e do mero seguir da inclinação ou obsessão, é guiada pela nossa ideia de bem.”
[2]

3º.- Sem valores não há ciência. A tese positivista de que o mundo existe independentemente de nós, ou seja, de que os factos são desprovidos de valorações está abandonada. Vejamos o que nos diz Feyerabend: “Claro que separar factos de valores não passa de um artifício. Os factos são constituídos por procedimentos que encerram valores; estes mudam consoante o impacto dos factos” (...) As ciências de hoje são empresas comerciais norteadas por princípios comerciais. A investigação em grandes institutos não se guia pela Verdade e pela Razão, mas pela moda mais recompensante, e os grandes cérebros de hoje cada vez mais se viram para onde está o dinheiro.” 3

1.Edgar Morin in: O Paradigma perdido. Publicações Europa América. p.86.
2.H. Putnam, in. Razão, Verdade e História. Publicações D. Quixote, Lisboa
3. Paul Feyerabend, in. Adeus à razão. Edições 70. p.122/4

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