segunda-feira, junho 05, 2006

 

A nova política e uma ministra que olha para os professores como se fossem os criados de uma patroa

Sempre que um ministro recebe duras criticas pelas medidas que anuncia, vímo-lo a multiplicar-se em entrevistas aos diferentes meios de comunicação. Por detrás deste frenesim está o trabalho das empresas ou agências de comunicação. Elas encarregam-se de disponibilizar os meios que permitam ao ministro convencer as pessoas de que as suas polémicas medidas são orientadas pelos motivos mais nobres da governação. É que o ministro sabe, como sabem as agências de comunicação, que quanto mais convencer o auditório universal (todos os que o ouvem) mais pressão pode exercer sobre o auditório particular ou específico (os que vão ser objecto das suas medidas).

Este truque perverso da política-espectáculo denuncia uma nova tirania: a de, através das referidas agências, um ministro poder impor determinadas políticas, deixando o trabalho mais sujo para os meios de informação que, em vez de promoverem o contraditório, se encarregam de deixar que o ministro possa fazer crer que só ele tem razão.

Se houvesse contraditório à propaganda da ministra da Educação ter-lhe-ia sido perguntado:

1º Na hipótese de dar aulas, como entenderia a eventualidade de ser avaliada a sua relação com os alunos pelos pais dos 40% dos alunos que faltaram ao exame da primeira época e dos cerca de 20% que chumbaram?!...

2º Tendo-se como certo que a educação que os alunos recebem em casa se reflecte na escola, como vê os pais que, por diferentes razões (estão ausentes, pertencem a famílias desestruturadas ou em conflito com os filhos, etc.,) não conseguiram educar os seus filhos, estarem, agora, a avaliar a relação que os professores estabelecem com eles na escola?!...

3º Só uma minoria de pais se preocupa com os filhos que frequentam as escolas. Quem responde pelos outros pais que, por diferentes razões, estão alheados da escola?!... Será que esse tipo de avaliação não contribuirá para discriminar os alunos na escola?!...

4º A parcela de avaliação dos professores atribuída aos pais não poderá constituir um instrumento perverso de pressão sobre alguns professores mais exigentes, mais disciplinadores, na atribuição de notas?!... E isso é ou não factor de discriminação e maior diminuição da qualidade do ensino?!...

5º Serão os professores os maiores culpados do insucesso escolar ou políticas de ensino que permitiram programas onde a mesma matéria se dá de formas diferentes em diversas disciplinas; horários que fizeram da escola o armazém onde os pais podem deixar os filhos durante oito e nove horas por dia; directivas que minaram a autoridade dos professores (como aconteceu com os regulamentos disciplinares) possibilitando que alunos com dezenas de participações disciplinares por comportamentos graves e, por vezes, criminosos, nunca pudessem ser expulsos ou sujeitos a um programa de reabilitação por especialistas?!...

6º Serão os professores culpados dos “rodriguinhos pedagógicos” que encharcaram a escola do “faz de conta”?!...

Estas questões do direito ao contraditório podiam continuar. Os professores são maltratados pelos alunos, pelos dirigentes (que deixaram de ser professores) das associações de pais, pela instabilidade de emprego, pela mediocridade que domina os directórios do sistema e, agora, pela verbo utilizada por uma ministra que olha para os professores como, antigamente, as patroas olhavam para as suas criadas.

Esta ministra não sabe avaliar o sistema que dirige, nem as consequências do seu verbo na desmotivação e degradação da imagem dos professores e, consequentemente na imagem do ensino.

Esta ministra pode ser uma boa dona de casa, mas desconhece os factores que influenciam o ensino, que estabelecem as relações de aprendizagem e, por isso, não é uma ministra da Educação.

Arranje-se uma ministra, antes que a ilusão de termos uma ministra se torne num pesadelo de termos este governo!

Comments:
Penso que o conceito "ferocidade" é exagerado relativamente ao meu texto. Tenho o direito a indignar-me, porque penso que um dos factores de sucesso de uma política é o respeito pela dignidade dos que são de uma forma ou de outra colaboradores na sua execução. A Ministra generaliza, mede todos pela mesma bitola, e olha para os professores como se eles não exercessem a sua actividade num contexto de número de alunos por turma, com determinados programas, em certas condições de autoridade profissional, com salas de aula degradadas, etc. Por outro lado, hoje, um ministro que pense a escola tem de aceitar que a escola de hoje já não pode ser a mesma que surgiu com o paradigma da revolução industrial. A ministra não compreende isto e, por isso, desvia para uma parte da questão todos os problemas, o que é, no mínimo, feio. Sempre houve maus professores, mas não foi isso que tirou qualidade á escola. A escola de hoje tem de ser mais pequena, exigir um trabalho de equipa, promover a interdisciplinaridade e ser avaliada em função de projectos. O professor solitário, avaliado individualmente, já não faz sentido. São as equipas que se devem autoavaliar e serem avaliadas e não o professor solitário.
Aliás, há uma contradição no que diz a Ministra: se a avaliação dos pais é minimalista, então é um "faz de conta" que é avaliação e isso não é correcto sob o ponto de vista educativo. Avaliação minimalista só conheço a do Padre Américo: "não há rapazes maus".

Gosto desta interactividade. Ajuda-nos a clarificar pensamentos. Obrigado critico cerrado(?!...)
 
Lamento ter de lhe dizer, mas esta não é uma margem esquerda! Sim. Porque uma margem esquerda é tolerante, consiliadora e inclusiva e quem defende a expulsão como solução para um problema de modo algum está à esquerda.
 
Essa é a sua opinião. Curiosamente cheia de certeza. A minha ideia é que ser ministro é um cargo ao serviço do interesse comum que deve ser ocupado por quem for mais competente e tiver mais sentido de Estado. Penso que pedir a substituição de um ministro não é pedir a sua expulsão. Expulsão não é um conceito que faça parte do meu vocabulário e desafio-o a contradizer o que afirmo.
 
Só mais uma coisinha. O cargo de ministro, pela sua natureza política, é transitório. Não se pode expulsar ministros, porque isso significava que o cargo se identificava com a pessoa. Já houve quem dissesse “o Estado sou eu”. Em democracia, os ministérios persistem independentemente de quem os ocupa. É, por isso, legitimo pedir a sua substituição, até para bem da dignidade da instituição. Pedir que se arranje outro ministro é um exercício cívico que qualquer cidadão tem o direito de exercer. E essa substituição, no meu ponto de vista, mais cedo ou mais tarde terá de acontecer
 
Gostava, ainda, de dizer mais o seguinte:

Quem disse-- “O estado sou eu” – era “incluso”, mas não era, naturalmente, de esquerda. Também penso que ser de esquerda é ser tolerante, mas a tolerância não é o “vale tudo”. Hei-de, mais tarde, colocar um post sobre a questão “esquerda / direita”. Digo-lhe, desde já, que não entendo esse tema de forma rígida, porque penso que há procedimentos tidos como de esquerda que, no meu ponto de vista, são de direita. A questão prende-se com o sentido do mundo da vida. Penso que há conceitos geradores de um sentido de esquerda no mundo da vida, como, p. ex., o conceito de serviço público, bem comum, tolerância pelo respeito das diferenças (e de as poder seguir), generosidade, avaliar consequências das acções, abertura, futuro e os clássicos “igualdade” (e não igualitarismo), fraternidade, liberdade (como condições para poder dar um sentido pessoal á sua vida). Esquerda é um conceito mais ético que programático, no meu entender. Espero as suas críticas. O mais interessante nos blogs é o debate.
 
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