terça-feira, maio 30, 2006

 

Maldição

A chamada maldição dos recursos, neste caso, do petróleo e gás natural, anda à solta nas ruas de Díli. A partir de reivindicações profissionais nas Forças Armadas, a segurança interna em Timor-Leste degradou-se nos últimos meses ao ponto de explodir em escaramuças armadas à volta de instalações militares na capital do país. Não parece crível que a dissensão se limite a algumas reivindicações corporativas. Estas servem apenas de rastilho para detonar uma situação social explosiva, que precisava de tempo, de calma e de apoio económico externo para ser superada. A transição para a independência provocou, a par de um esforço notável de reconstrução, uma quebra muito acentuada nos dois anos seguintes devido à retirada maciça dos quadros estrangeiros. Essa quebra fez-se sentir, sobretudo, em Díli. O ano de 2006 marca o início de um plano ambicioso de investimentos nos sectores sociais e nas infra-estruturas, apoiado recentemente pelo Banco Mundial e pela comunidade de países amigos, destinado a alargar o espaço de actuação da economia de mercado às zonas rurais, atacando os fundamentos da ancestral pobreza de grande parte do povo timorense. O Fundo Estratégico do Petróleo, gerido segundo os mais altos padrões de prudência e transparência, constitui a base financeira para esse programa que ou é prosseguido com persistência durante várias décadas ou arrisca-se a fracassar nos seus propósitos. Mas as receitas do petróleo constituem uma tentação para quem as queira controlar em proveito próprio. Ainda não arrancou o segundo, e maior, campo de gás natural e elas já estão na casa dos 300 milhões de dólares anuais, quando o PIB do país não vai além dos 350 milhões. Este dado, somado a uma população jovem desempregada, calculada em 20 mil só em Díli, dá-nos uma chave para explicar a desestabilização em curso. Que, em qualquer caso, já quebrou a confiança dos investidores estrangeiros, sem os quais Timor-Leste não poderá criar a economia dinâmica de que tanto precisa.

António Perez Metelo
IN: DN de 25.05.06

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